Antes de qualquer direito, temos deveres. O que gera conflito entre a Bíblia e os não cristãos, é o fato que ela aborda extensamente os deveres humanos, de Gênesis ao Apocalipse e trata relativamente pouco dos direitos humanos. E, quando trata dos direitos, quase sempre tem a ver com resultados do cumprimento dos deveres. Isso ocorre, porque os princípios bíblicos baseiam-se na Lei de Deus que tem a ver com deveres (Êxodo 20).
Um detalhe que surge ao longo da formação de sociedades humanas, nas mais variadas culturas, é a formatação de legislações que começam pela ênfase nas regras para garantia dos direitos. Os deveres ficam relegados ao segundo plano. Os direitos geram debates e discussões, dificultando as relações humanas que vão se tornando insustentáveis, fazendo prevalecer a “lei do mais forte”, pelo dinheiro e poder sobre a Justiça.
Por mais que evolua, ao longo da história, a consciência da necessidade de obedecer leis e normas para que direitos sejam garantidos, os tais direitos humanos se tornam seletivos. Nem mesmo os direitos considerados inalienáveis são mantidos. Palavras como justiça, liberdade e igualdade se tornam vazias de significado prático.
A minha geração nasceu com direitos legalmente garantidos, mas que não me beneficiam a menos que eu lute ou pague por eles. Apesar do processo de reconhecimento desses direitos através de legislações, os magistrados não são livres para julgar. São nomeados, corporativamente, para obedecer uma minoria privilegiada por uma “meritocracia” oligárquica.
A tão badalada defesa das minorias servem, na verdade, a ideologias desenvolvidas em laboratórios sociológicos sob coordenação dos senhores que lucram com todos os tipos de guerras e conflitos sociais, sejam quentes, frios ou híbridos.
O século 21 tem projetado uma visão distópica tenebrosa para o futuro da humanidade. Até cristãos caem no engodo e perdem tempo com as filosofias e vãs sutilezas das tradições e rudimentos das ideologias humanas (Cl 2.8). Cada dia vemos mais crentes, inclusive pastores, se engajando em militâncias variadas dos direitos individuais e coletivos, ao mesmo tempo em que vemos definhar estratégias evangelísticas e missionárias. Há poucos apelos desafiadores para que crentes se consagrem ao ministério.
Eu não preciso de direito, nem de liberdade para pregar o Evangelho. Preciso de obediência à Grande Comissão que é uma ordem, tanto para o indivíduo que terá que prestar conta de si mesmo a Deus, quanto para a Igreja, como um todo, que desde o início em Jerusalém, precisou de um toque de perseguição, para entender que todos devem se espalhar pelas judéias, samarias e até aos confins da terra. Eu não tenho o direito de ser cristão, nem preciso de direito para pregar a mensagem de salvação. Também não preciso defender a Palavra de Deus, pois ela é forte o suficiente para se deixar prender (2Tm 2.9).
Minha responsabilidade é fazer a palavra chegar às pessoas para produzir fé. Por isso, o texto de Romanos 10.10-15 precisa ser lido: “¹⁰ Visto que com o coração se crê para a justiça, e com a boca se faz confissão para a salvação. ¹¹ Porque a Escritura diz: Todo aquele que nele crer não será confundido. ¹² Porquanto não há diferença entre judeu e grego; porque um mesmo é o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam. ¹³ Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. ¹⁴ Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? e como crerão naquele de quem não ouviram? e como ouvirão, se não há quem pregue? ¹⁵ E como pregarão, se não forem enviados? como está escrito: Quão formosos os pés dos que anunciam o evangelho de paz; dos que trazem alegres novas de boas coisas”.
O cristão é livre. A Bíblia ensina que em Cristo somos livres (Gl. 5.1). Diríamos, “verdadeiramente livres” (Jo 8.36). Será que a Bíblia está errada ou é nossa concepção de liberdade que não se encaixa no que ela diz? A priori, a nossa liberdade tem a ver com ser livre da condenação, da escravidão e do poder do pecado. Somente assim podemos dizer “não’’ ao pecado.
É necessário atentarmos para o conceito de escravidão, para facilitar a compreensão do conceito bíblico de liberdade. Todos nós concordamos que sem Cristo, todos são escravos do pecado e do poder do pecado. Escravo não tem escolha. Quando um escravo do pecado é justificado pela fé em Cristo, ele passa a compreender o que é, de fato, liberdade, pois não está mais sob o senhorio déspota do pecado. Ao invés de submeter-se aos seus desejos pecaminosos, ele passa a obedecer a Deus, mudando de Senhor. Ele foi transportado do “império das trevas, para o Reino do Filho” (Cl 1. 13-23), e passa a servir a Cristo, cujo “jugo é suave e o fardo é leve” (Mt 11.28-30).
Liberdade nada tem a ver com a falta de um senhor. Por isso é complexo entender o que é ser livre. Tudo e todos no Universo existe sob submissão. A obediência, em si, é a melhor definição de liberdade para o cristão. A Terra está sujeita à lei da gravidade. O cidadão está sob as leis do seu país. A sujeição de Cristo ao Pai é o exemplo maior de liberdade, na qual está implícita a linguagem do amor. A obediência aqui é pelo amor e não pela subjugação de um déspota. Na linguagem do amor de Deus aprendemos a obediência na liberdade (Jo 14.15).
Portanto, dialogar sobre liberdade com os filhos das trevas, escravos do pecado, é perder-se nas vãs filosofias mencionadas pelo apóstolo Paulo em Colossenses 2. A evidência objetiva da salvação é que a pessoa salva tem prazer em obedecer a Deus (Sl. 119.47). O salvo não entra em contenda com os perdidos tentando terceirizar a eles e aos seus governos, aquilo que compete à Igreja fazer (2Tm 2.24-26).
Comentarios